segunda-feira, 5 de novembro de 2012
ENEM: um exemplo para SP, onde se governa para rico
Subtrair espaços à exclusão equivale, no Brasil, a estreitar o horizonte político do conservadorismo. E vice versa.
A atordoante derrota de Serra em SP credencia a maior cidade do país, uma das três maiores manchas urbanas do planeta, a se tornar uma gigantesca referencia de políticas sociais emancipadoras, travadas até agora pela blindagem tucana.
O golpe é superlativo; mais superlativas serão as consequências se o PT agir com desassombro. Os derrotados sabem que uma seta do tempo foi disparada no dia 28 de outubro de 2012; ela tem potencial para traçar um novo divisor de ciclos na política brasileira.
Desdenhar do feito de Lula é uma forma de acusar o golpe. Outra é tentar implodir seu autor e o seu entorno.’Veja’, os mervais, robertos freires e que tais estão soltos na praça sem focinheira. Estão fazendo as duas coisas ao mesmo tempo. E com o mesmo objetivo: querbrar a seta do tempo nesse lusco-fusco histórico.
O êxito do Enem nesse momento, uma semana depois da derrota maiúscula do PSDB em sua casa, não poderia acontecer em hora mais ingrata.
O sucesso do Exame Nacional do Ensino Medio representa um giro adicional no torniquete de dupla volta que desde 2002 subtrai oxigênio social e político aos interesses conservadores.
Compreensível o clima pesado excretado pelo dispositivo midiático.
Mais uma vez ele se coloca na linha de frente quase solitária de uma direita agressivamente gananciosa, mas incompetente para gerar agendas e lideranças aglutinadoras. Serra era o seu delfim até ontem.
O Enem condensa um desmentido contundente das premissas que essa engrenagem sempre combateu.
Em primeiro lugar, atesta que existe política para pobre e política para rico neste país.
Ademais de ilustrar a disjuntiva colocada em dúvida por Serra na sua campanha, exemplifica como uma política pública pode mudar a relação de forças no país.
A má vontade conservadora com o exame do ensino médio poderia surpreender. O Enem foi criado no governo FHC, em 1998, para medir a qualidade do ensino.
Mas foi com Lula, em 2009, que adquiriu a dimensão de uma gigantesca alavanca social, ao se tornar referência e mesmo alternativa ao vestibular de ingresso ao ensino superior.
Este ano, 95% das universidades federais vão utilizar em alguma medida as notas do exame para selecionar os alunos que ocuparão as vagas de 2013.
Mas a nota no Enem serve ainda como passaporte para ingresso no ProUni, bem como para o Fies, o Fundo de Financiamento Estudantil, ademais de representar o passaporte de acesso à política de Cotas.Em quatro anos, 50% das vagas nas instituições federais serão destinadas a egressos das escolas públicas, com recorte asociado, por renda e por raça.
Em 1997, no governo tucano, apenas 4% dos estudantes matriculados nas universidades brasileiras eram constituídos de jovens pretos e pardos. Hoje essa fatia saltou para 20%. E deve aumentar depressa.
Dos cerca de 5,7 milhões de inscritos no Enem este ano, 2,42 milhões se declaram brancos; 2,4 milhões são pardos; 694 mil, pretos e 35 mil, indígenas.
A educação superior no Brasil ainda é um dos sistemas de ensino mais excludentes do mundo.Estão na universidade apenas 13% dos jovens na faixa entre 18% e 24 anos.
Na América Latina, a média é superior a 30%;na Europa, EUA e Ásia é da ordem de 70%
Nos anos 90, a justificativa tucana para a exclusão era de que a prioridade deveria estar focada na educação básica, não em universidades. Como se fosse possível ter bons professores nos ciclos básicos sem ter um ensino superior de escala e qualidade compatíveis para formá-los.
Sancionada a universidade para poucos, o funil do vestibular fazia todo o sentido. Era o arremate de uma arquitetura feita para excluir e não para incorporar.
O Enem reformulado no governo Lula tornou-se a peça mais incomoda de subversão dessa lógica, que reservava toda a universidade à cota exclusiva da elite.
É por essas e outras que o êxito do exame nacional neste fim de semana –recohecidamente bem formulado e sem fraude– não poderia vir em pior hora para os interesses abalados pela revés eleitoral em SP.
(Saul Leblon- Carta Maior/via Conversa Afiada)
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