quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Mínimo se valoriza e chega a 1/3 do salário médio

O aumento real de pouco mais de 60% do salário mínimo desde 2003 encurtou a distância entre o valor do piso e o rendimento médio nas seis principais regiões metropolitanas do país, que teve alta de quase 20% acima da inflação no período. O reajuste do mínimo ajudou a impulsionar o consumo das famílias nos últimos anos, ao elevar significativamente o poder de compra de uma fatia expressiva da população. Na média de 12 meses até março de 2003 (um mês antes de subir de R$ 200 para R$ 240), o mínimo equivalia a 24% do salário médio nas maiores regiões metropolitanas, proporção que atingiu 34% em janeiro deste ano, na mesma base de comparação, segundo cálculos e estimativas da Quest Investimentos.

O economista Fabio Ramos, da Quest, diz que os números deixam claro o avanço mais forte do poder de compra de quem tem o rendimento indexado ou referenciado ao mínimo em relação ao restante da população nos últimos anos. Estão nesse grupo cerca de dois terços dos beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas, voltado para idosos e pessoas com deficiência), empregadas domésticas, outros trabalhadores de baixa renda e funcionários de prefeituras de cidades menores.

O aumento do mínimo foi calculado com base na média em 12 meses para suavizar eventuais oscilações bruscas. No caso do rendimento médio nas seis principais regiões metropolitanas, o número leva em conta estimativas da Quest para dezembro de 2010 e janeiro de 2011.

Para Ramos, o aumento expressivo do salário mínimo contribuiu para impulsionar especialmente o consumo de bens semi e não duráveis (como alimentos, vestuário e calçados) e de alguns bens duráveis (como eletrodomésticos e celulares). Em 2003, eram necessários um pouco mais de três salários mínimos para comprar uma geladeira. Hoje, pouco mais de 1,5 mínimo é suficiente para pagar um refrigerador, segundo cálculos de Ramos. Além da alta do mínimo, a queda em termos reais (descontada a inflação) dos preços do eletrodoméstico tem peso importante nesse movimento, diz ele, observando que o câmbio valorizado e o aumento das importações ajudaram a baratear os bens duráveis.

A comparação entre o mínimo e a cesta básica também evidencia o ganho de poder de compra de quem recebe o piso. Em março de 2003, o mínimo valia R$ 200, o equivalente a 1,14 cesta básica em São Paulo. O novo piso, de R$ 622, compra 2,2 cestas, considerando que o valor ficará igual aos R$ 227,27 registrados em dezembro. Cálculos do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apontam para uma injeção de R$ 47 bilhões na economia com o novo valor do mínimo.

O professor Claudio Salm, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que os aumentos do salário mínimo concedidos a partir da segunda metade dos anos 90 recuperaram o poder de compra do salário mínimo, que havia caído muito especialmente nos anos 60. “Depois disso, o salário mínimo ficou por muitos anos com um valor muito baixo, que precisava ser recomposto.”

Salm concorda que o aumento do salário mínimo ajudou a impulsionar o consumo das famílias, destacando um papel importante na redução da desigualdade de renda ocorrida nos últimos anos. “A alta do salário mínimo e o mercado de trabalho forte são os fatores que mais ajudaram nesse processo”, afirma ele.

Para Salm, o Bolsa Família também teve sua contribuição nesse movimento, mas bem mais modesta, dada a sua pequena magnitude, equivalente a cerca de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB). “O salário mínimo atinge um número bem maior de pessoas, influenciando mais na distribuição de renda.”

Um ponto importante, segundo ele, é que o salário mínimo aumentou significativamente nos últimos anos sem que isso tenha provocado aumento do desemprego e da informalidade. “O valor do mínimo cresceu muito e a taxa de desemprego e a informalidade caíram. Ocorreu o contrário do que previam muitos analistas.” Ele não vê problemas no aumento de cerca de 14% concedido ao mínimo neste ano, resultado da regra que prevê o reajuste pela combinação da variação do PIB de dois anos antes e da inflação do ano anterior.

O economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos, acha que os reajustes elevados do mínimo podem estar próximos do limite, havendo o risco de eventualmente aumentarem o desemprego e a informalidade. “Uma coisa é aumentar o salário mínimo quando a economia cresce 4%, outra é quando cresce bem menos que isso”, afirma ele.

Professor da PUC-Rio, Camargo diz ver o aumento do mínimo com simpatia, mas chama a atenção para o custo da alta. Os reajustes elevados impactam os gastos correntes do governo, por corrigirem transferências como aposentadoria, seguro-desemprego e benefícios do Loas, o que tira espaço para elevações mais fortes do investimento público, diz Camargo.

Salm considera o baixo investimento público um problema a ser enfrentado, mas não acha que o aumento dos gastos com o salário mínimo seja o culpado. Segundo ele, o problema do baixo investimento público vem de longa data, tendo ocorrido mesmo quando o salário mínimo tinha reajustes medíocres.

Ramos também destaca a evolução do salário mínimo em dólares. A alta foi ainda mais forte, pela combinação de aumento real do piso em reais e da forte valorização do câmbio. Na média dos 12 meses até março de 2003, o salário mínimo equivalia a US$ 64,06, valor que subiu para US$ 327,13 na média até janeiro deste ano, considerando um dólar médio de R$ 1,85 no mês. Nesse período, o aumento foi de 410%. Há pouco mais de uma década, uma das grandes bandeiras de alguns políticos, como o senador Paulo Paim (PT-RS), era elevar o piso para US$ 100.

Segundo Ramos, essa evolução mostra principalmente o efeito dos ganhos dos termos de troca (a relação entre preços de exportação e de importação) nos últimos anos. “É o efeito China sobre a baixa renda”, diz ele. O resultado é tornar mais acessível a compra de bens duráveis, suscetíveis à variação do câmbio.

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