terça-feira, 17 de julho de 2012

Sem política habitacional, remoções e despejos avançam em SP

Moradores do centro e da periferia de São Paulo se reuniram para a realização de um ato em protesto contra as ordens de despejo e reintegração de posse que podem desalojar milhares de famílias em toda a capital paulista. A concentração para a manifestação, realizada na quarta-feira (11), iniciou na rua Mauá, no bairro da Luz. Os manifestantes percorreram o centro da cidade, até chegarem ao prédio da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU). Cerca de 1500 pessoas participaram da ação.
Os manifestantes reivindicam que o poder público garanta alternativas habitacionais, oferecendo moradia digna para as famílias. Além disso, denunciam as ações de violência e intimidação que ocorrem antes e durante as remoções. Somente na Região Central de São Paulo, as ordens de reintegração de posse atingiram 560 famílias que ocuparam imóveis abandonados, e residem no local há pelo menos cinco anos.
A Justiça havia determinado a reintegração de posse a partir do dia 16 de julho do prédio da rua Mauá, onde residem mais de 200 famílias. A sentença foi suspensa por tempo indeterminado mediante recurso apresentado pelos moradores. O integrante da Assembleia Popular Jonathan Constantino considera uma vitória parcial o Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo ter aceitado o recurso e ressalta a importância dos movimentos por moradia ficarem em alerta e resistirem.
“A gente não pode recuar, porque o histórico que a gente tem no estado de São Paulo, e aqui na cidade, é que quando a gente recua na nossa luta as forças de repressão e a Justiça do estado vêm pra cima da gente pela madrugada para tirar a gente do nosso lar. Então, a gente tem que permanecer na rua, permanecer construindo, lutar, reivindicando o direito de permanecer ali, pedindo a desapropriação daquele prédio para a construção de moradia social”, afirma Constantino.


Rodoanel
As ameaças de despejo não atingem somente o centro da cidade. As grandes obras também têm gerado remoções nas regiões mais afastadas. O governo de São Paulo, no início do mês de abril, publicou no Diário Oficial do estado a reabertura da licitação do trecho norte do Roadoanel e assinou decretos para desapropriar aproximadamente 250 imóveis. O empreendimento, orçado em R$6,5 bilhões, recebe recursos do governo do estado, do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento, e pode desalojar 10 mil pessoas.  
Famílias residentes de Perus, distrito da região noroeste de São Paulo, até a cidade de Guarulhos podem ser afetadas pela construção. Com uma extensão de cerca de 44km, o trecho norte do Rodoanel pretende interligar a Rodovia Fernão Dias e a Avenida Inajar de Souza aos trechos Leste e Oeste do anel viário.
Duilia Simões, moradora do bairro Jardim Paraná, região que será impactada pelas obras, relata o desencontro de informações sobre as moradias que serão atingidas.
“A Dersa [empresa responsável pelo gerenciamento da obra] alega que já tem os terrenos para as novas moradias, mas não abre para nós, não diz onde é. O Ministério Público deixou claro para nós que esses terrenos não existem. A obra já está quase na fase de cadastramento das famílias e nós não sabemos ainda sequer se existe um terreno ou não para as novas moradias”, relata Duilia.
Além dos problemas sociais, o empreendimento poderá trazer grandes impactos ambientais. A Serra da Cantareira, considerada a maior floresta em área urbana do mundo, terá suas reservas naturais atingidas. A serra possui o principal sistema de água da capital e abriga diversas espécies da Mata Atlântica.  
Nos trechos já implantados do Rodoanel (sul e oeste), a construção da rodovia afetou a dinâmica da vida dos moradores. Jonathan Constantino conta que as obras não tiveram planejamento adequado para atender as pessoas que vivem na região. “Da noite para o dia uma rodovia passa onde tinha uma avenida e você tem que tentar pular por cima de uma rodovia para ir para a escola que fica do outro lado. Têm regiões que os professores não conseguem mais chegar para dar aula, que as famílias não têm como atravessar a rodovia porque não tem passarelas. Os moradores tem que pagar pedágio, dar volta para entrar dentro de casa ou dar volta para sair para trabalhar”, descreve.

Itaquerão
Na Zona Leste de São Paulo, a construção do estádio “Itaquerão” para a Copa de 2014 também ameaça os moradores atingidos pela obra. O coordenador nacional da Central de Movimentos Populares (CMP), Benedito Barbosa, relaciona as remoções ao interesse do capital imobiliário.
“A gente sabe que essas obras na verdade estão abrindo fronteiras para a especulação imobiliária na cidade de São Paulo. Esse processo de remoção e despejo está atingindo quase 70 mil famílias na cidade de São Paulo, que estão sofrendo algum tipo de deslocamento em função desses megaprojetos e dessas megaobras, e uma agenda concentrada para terminar pelo menos grande parte desses projetos e dessas intervenções até 2014 com a realização da copa do mundo no Brasil”, alega Barbosa.
Na capital, há ainda outros projetos que podem gerar despejos, como o Nova Luz, as Operações Urbanas Água Branca e Lapa-Brás e o Parque Linear Várzea do Tietê. A estimativa dos movimentos de moradia é que o déficit habitacional do estado de São Paulo seja de 2 milhões de unidades.
Durante o ato foi tirada uma comissão de representantes dos moradores atingidos pelas remoções para se reunir com o presidente da CDHU. Entre os principais compromissos assumidos pelo órgão está a garantia de 660 unidades habitacionais na Região Central. O pagamento da bolsa aluguel para as famílias que ficaram desabrigadas após despejo na zona sul também foi retomado. O beneficio estava suspenso há 14 meses.
(Brasil de Fato)

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